Dilma pede colaboração dos países desenvolvidos


20/06/2012


O primeiro dia da cúpula da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, contou com a presença de Chefes de Estado e do Governo, no Riocentro. No início da cerimônia, na manhã desta quarta-feira, 20, a Presidente Dilma Roussef foi eleita a presidente da conferência. Ela fez um discurso de agradecimento e boas vindas aos participantes, e, dando continuidade ao encontro, passou a palavra para o Ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota.
 
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, comentou, em seguida, os resultados das negociações:
—Estamos diante de um acordo histórico, não vamos perder esta oportunidade. O mundo está nos observando para ver se seremos capazes de fazer mudanças. A Rio+20 não é o fim do processo, mas apenas o começo dele. Está na hora de pensarmos globalmente e localmente. Estamos lutando contra o relógio.
 
Antes dos discursos dos Chefes de Estado e Governo, a estudante Brittney Trilford, 17 anos, da Nova Zelândia, fez um apelo aos participantes da reunião em defesa do meio ambiente. Brittney foi escolhida para por 350 ONGs em uma seleção promovida pela ONU no concurso Encontro com a História.
—De forma corajosa e ousada, façam o que é certo. Estou aqui hoje para lutar pelo meu futuro. Estão aqui para fazer bonito ou para nos salvar? O relógio está correndo, lembrou a estudante.
 
Na sequência, os líderes mundiais discursaram sobre temas da conferência.
 
Responsabilidade
 
No final da tarde, foi realizada a abertura oficial da reunião dos Chefes de Estado. A Presidente Dilma defendeu o texto apresentado pela delegação brasileira e cobrou ações mais incisivas por parte dos integrantes da cúpula:
—Estamos reunidos no Rio para dar passos audaciosos, mostrar coragem e assumir responsabilidades. Estamos aqui, porque o mundo demanda mudança. Há princípios sobre os quais temos de atuar. Os seres humanos estão no centro das preocupações.

Dilma ressaltou a necessidade de colaboração entre as economias mais ricas e os países em desenvolvimento:

—A transferência das indústrias mais poluentes, do Norte para o Sul do mundo, colocou as economias desenvolvidas no rumo de uma produção tida como mais limpa. Mas deixou pesada a carga e a conta socioambiental para os países em desenvolvimento. A promessa de financiamento do mundo desenvolvido para o mundo em desenvolvimento com vistas à adaptação e à mitigação ainda não se materializou nos níveis prometidos e necessários.
 
Em seu discurso, a presidente destacou ainda que os compromissos de redução das emissões de gases poluentes, previstos pelo Protocolo de Quioto, não foram atingidos, e que várias conquistas da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio92, permanecem no papel.
—O modelo de desenvolvimento do Brasil avança no sentido da sustentabilidade, o que autoriza o País a demandar mais contribuição dos países desenvolvidos.
 
Manifestações
 
O primeiro dia de reunião dos Chefes de Estado e de Governo na Rio+20, nesta quarta-feira, foi marcado por manifestações da sociedade civil. Durante a manhã, no Riocentro, manifestantes protestaram contra o documento final da Rio+20 aprovado nesta terça-feira, dia 19, e exigiram a revisão do texto.
 
Na primeira sessão plenária da conferência, realizada no final da manhã, Waek Hamidan, representante da Rede de Ação Climática, discursou em nome de 1.000 organizações não governamentais e pediu que seja retirado o apoio das entidades civis ao documento final aprovado na Conferência da ONU para o Desenvolvimento Sustentável. As ONGs manifestaram indignação contra o conteúdo do texto, alegando que o mesmo não atende às demandas sociais e ambientais apontadas pelas entidades que participaram das negociações como observadoras.
 
—Estamos à beira de transformar a Rio +20 em tentativa frustrada, com os governos apenas tentando proteger seus interesses estreitos em vez de inspirar o mundo e de nos devolver a fé na humanidade que precisamos. Se isso acontecer, seria um grande desperdício desse poder e desta oportunidade de liderança, disse Hamidan.
 
A Rede de Ação Climática (CAN, na sigla em inglês) é uma entidade internacional, que reúne mais de 700 organizações não governamentais em defesa do meio ambiente. No último fim de semana, a organização criticou o penúltimo rascunho do texto final da Rio+20.
 
O Ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, discordou das críticas das ONGs:
—O governo brasileiro criou a conferência mais inclusiva da história da ONU [Organização das Nações Unidas]. Aqui, no Rio de Janeiro, estamos dando vozes a ONGs e ao setor privado para que se expressem. É natural que queiram mais e sejam mais ambiciosas.
 
Marcha
 
Cerca de 20 mil pessoas, entre servidores públicos, estudantes, representantes de ONGs, entidades sindicais e movimentos sociais participaram da Grande Marcha da Cúpula dos Povos, na tarde desta quarta-feira, 20, no Centro. Com faixas e cartazes, os manifestantes chamavam a atenção para a falta de compromisso com a causa ambiental e de objetividade expressos no documento aprovado na Rio+20.
 
Também à tarde, foi realizado mais um protesto nas imediações do Riocentro.
 
Internet
 
O coletivo hacker Anonymous manifestou na rede seu protesto contra o posicionamento da conferência da ONU. O site do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) foi alterado e teve um vídeo postado sobre a conferência, no qual um membro do coletivo Anonymous afirma que a Rio+20 precisa incluir a opinião da sociedade civil nas decisões.
 
“O Anonymous observa que reuniões e mais reuniões de líderes mundiais são feitas na tentativa de resolver problemas que, na maioria das vezes, são criados por eles mesmos, como uma receita de bolo para que tudo acabe bem “, diz o vídeo disponível no Youtube.
 
Os sites da Câmara dos Deputados e do Senado também foram alvos dos hackers, mas tiveram o acesso normalizado à tarde. Outros endereços de internet, mais de trinta sites, foram publicados no Twitter como alvos do Anonymous. O grupo promete mais ataques durante o evento sobre meio ambiente. 
 
*Com Instituto Socioambiental, Agência Brasil, Terra, O Globo.
 
 
Leia a íntegra do discurso de Waek Hamidan na Rio+20:
 
“Eu estou fazendo esta declaração em nome das ONGs na Rio +20.
 
É uma sensação incrível estar nesta sala entre todos os líderes mundiais e sentir ao meu redor todo esse poder que pode moldar o mundo. Nós todos conhecemos a ameaça diante de nós e eu não preciso repetir a urgência. A ciência é muito clara. Se não mudarmos nos próximos cinco a dez anos a forma como as nossas sociedades funcionam, estaremos ameaçando a sobrevivência das gerações futuras e todas as outras espécies do planeta. No entanto, vocês sentados aqui nesta sala tem o poder de reverter tudo isso. O que vocês podem fazer aqui é o sonho de cada um de nós: ter a oportunidade de sermos os salvadores de todo o planeta.
 
E no entanto estamos à beira de transformar a Rio +20 em tentativa frustrada, com os governos apenas tentando proteger seus interesses estreitos em vez de inspirar o mundo e de nos devolver a fé na humanidade que precisamos. Se isso acontecer, seria um grande desperdício desse poder e desta oportunidade de liderança.
 
Não se pode ter um documento intitulado “o futuro que queremos” sem qualquer menção aos limites planetários, pontos de inflexão ou à capacidade da Terra. O texto, tal como está, perdeu completamente o contato com a realidade. Só para ficar claro, as ONG aqui no Rio de modo algum endossam este documento. Já há mais de 1.000 organizações e indivíduos que assinaram em apenas um dia a petição chamada “O Futuro Que Não Queremos” que recusa totalmente o texto atual. Ele não reflete de forma alguma a nossa aspiração, e, portanto, exigimos que as palavras “com plena participação com a sociedade civil” sejam removidas do primeiro parágrafo.
 
Se vocês adotarem o texto em sua forma atual, vocês deixarão de garantir um futuro para as futuras gerações, incluindo seus próprios filhos.
 
Para citar alguns exemplos de falhas no documento:
Na questão de encontrar recursos para implementar o desenvolvimento sustentável, vemos países que usam a crise econômica como uma desculpa, enquanto ao mesmo tempo gastam centenas de de bilhões de dólares com subsídios à indústria de combustíveis fósseis, a indústria mais lucrativa do mundo. A primeira coisa que vocês podem fazer é eliminar os subsídios prejudiciais existentes, especialmente os subsídios aos combustíveis fósseis, que foram eleitos como a questão número um durante os diálogos com a sociedade civil.
 
Sob a seção oceanos, vocês falharam em dar um mandato claro para pelo menos começar a negociar um acordo de implementação que interrompa o abuso estilo Velho Oeste do alto mar.
 
Existem muitas outras falhas no documento relacionadas à saúde reprodutiva da mulher, oportunidades perdidas para começar novos tratados globais sobre a participação da sociedade civil e em relatórios de sustentabilidade, a extraordinária falta de qualquer referência a conflitos armados, à energia nuclear (especialmente à luz do desastre de Fukushima ) e muitos outros.
 
Mas não é tarde demais. Nós não acreditamos que tudo tenha acabado. Vocês estarão aqui por mais três dias e vocês ainda podem inspirar-nos e ao mundo. Seria uma vergonha e um desperdício para você vir aqui só para assinar um documento. Nós o incentivamos a criar vontade política nova que nos façam ficar de pé e aplaudir vocês, como nossos verdadeiros líderes.
 
Obrigado.”
 
 
 
 
 
 
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