Desrespeito aos direitos humanos avança em todo o mundo, afirma a Anistia Internacional


Por Cláudia Souza*

29/05/2013


Anistia Internacional

Anistia Internacional

A carência de ações globais em relação aos direitos humanos está tornando o mundo um lugar cada vez mais perigoso para refugiados e migrantes, afirmou a Anistia Internacional (AI), no último dia 22, durante o lançamento dorelatório anual “O Estado dos Direitos Humanos no Mundo”, relativo ao ano de 2012.

— A incapacidade de lidar eficazmente com situações de conflito está gerando uma subclasse global. Os direitos das pessoas que fogem das guerras estão desprotegidos, disse Salil Shetty, secretário-geral da Anistia Internacional.

De acordo com Shetty, milhões de migrantes estão sendo empurrados para situações de abuso, incluindo trabalho forçado e abuso sexual, em razão das políticas anti-imigração.

— Muito disso é alimentado pela retórica populista de governos que atribuem suas dificuldades internas aos refugiados e migrantes.

O relatório Anistia Internacional destaca que em 2012, a comunidade global testemunhou uma série de emergências de direitos humanos que forçaram um grande número de pessoas a buscar segurança, dentro e fora das fronteiras dos países. “Desde a Coréia do Norte, até Mali, Sudão e República Democrática do Congo houve pessoas fugindo de suas casas, à procura de refúgio seguro. O mundo ficou observando enquanto os militares e policiais da Síria agrediam civis indiscriminadamente, e submetiam a desaparecimento forçado, detenção arbitrária, tortura e execução extrajudicial todos aqueles que consideravam contrários ao governo. Enquanto isso, grupos armados continuavam a fazer reféns, torturar e executar sumariamente em menor escala, afirma o estudo.

— O respeito pela soberania do Estado não pode ser usado como desculpa para a omissão. O Conselho de Segurança da ONU deve continuamente contestar os abusos que destroem vidas e obrigam as pessoas a fugir de suas casas. Isto significa rejeitar doutrinas desgastadas e desprovidas de moralidade de que massacres, tortura e fome não são da conta de ninguém, ressaltou Shetty, que aplaudiu a adoção pela ONU, em março de 2013, do Tratado sobre o Comércio de Armas:

— A proteção de refugiados e das pessoas deslocadas não pode mais ficar cabe a todos nós. O mundo sem fronteiras das comunicações modernas torna cada vez mais difícil esconder os abusos atrás das fronteiras nacionais, e oferece oportunidades sem precedentes para que todos possam defender os direitos dos milhões que precisaram deixar suas casas, afirmou Shetty.

Risco

O relatório da Anistia Internacional afirma que a União Europeia vem implementando medidas de controle de fronteira que colocam em risco as vidas de milhões de pessoas. “Em todo o mundo, os migrantes e requerentes de asilo são regularmente trancafiados em centros de detenção e, em casos extremos, são mantidos em engradados de metal ou até mesmo contêineres”, diz o texto.

Sobre este aspecto, Salil Shetty ressaltou que um futuro mais justo só será viável com o respeito aos direitos humanos, independentemente da nacionalidade dos cidadãos:

— Os direitos de um grande número dos 214 milhões de migrantes do mundo não foram protegidos pelo país de origem ou o hospedeiro. Milhões de imigrantes foram submetidos a trabalho forçado e, em alguns casos, ao regime de escravidão. Os governos os tratam como criminosos e as empresas se preocupavam mais com lucros do que com os direitos dos trabalhadores. O mundo não pode permitir zonas de exclusão na demanda global pelos direitos humanos. A proteção dos direitos humanos deve se aplicar a todos os seres humanos, onde quer que estejam.

Indígenas

Em relação ao Brasil, o estudo divulgado pela Anistia Internacional frisa que o país reúne leis que garantem o respeito aos direitos humanos de sua população, mas apresenta um déficit de justiça que permeia diversos setores da sociedade, especialmente em relação aos moradores de favelas e aos indígenas.

Outro ponto crítico levantado pela Anistia se refere às ações violentas por parte da polícia. O documento chama a atenção também para o déficit de justiça no caso das pessoas que lutam pelos direitos de comunidades ameaçadas, especialmente no campo.

Comissão da Verdade

Entre os avanços conquistados no Brasil em 2012, a AI cita a criação da Comissão Nacional da Verdade.

— A Comissão é um passo importantíssimo, porque o Brasil desenvolveu resistência muito grande a falar desse assunto – é uma conquista muito recente que possibilita essa discussão em âmbitos estaduais e também na imprensa. Além disso, ela permite que a sociedade se olhe no espelho, analise seu papel, seja de cúmplice, vítima ou espectador, e que, claro, o Estado assuma os crimes que cometeu, sublinhou Atila Roque, Diretor-executivo da Anistia Internacional Brasil, em entrevista à BBC Brasil.

Para Roque, o relatório evidencia que o Brasil deve decidir se quer ter os direitos humanos como política de Estado.

— Temos grandes projetos de desenvolvimento em curso e foco em alcançar um protagonismo global. Mas é preciso coerência. Desenvolvimento não é desenvolvimento sem respeito aos direitos humanos.

* Com informações da Anistia Internacional Brasil e BBC Brasil.