Crônica machista no Correio Braziliense provoca repúdio


12/09/2017


O jornalista Guilherme Goulart assinou a crônica intitulada “O primeiro dia de trabalho de Melissinha”. O texto, publicado na versão impressa do “Correio Braziliense” desta segunda-feira (11), também ganhou espaço na versão digital do jornal. O Correio, no entanto, apagou a crônica quase três horas após sua publicação.

No texto, Goulart conta a história da nova estagiária, Melissa, de 19 anos, que encantou a “machalhada” da redação. O artigo abusa de termos ofensivos e machistas e trata a profissional como objeto. “Melissa se apresentou à coordenação de pauta da editoria de Cidades no início da tarde, horário de repórter na rua. Mas aos poucos os representantes da fauna masculina não decepcionaram o resto da matilha”, diz um dos trechos do texto.

A página do Facebook “Jornalistas contra o assédio” publicou uma nota de indignação com o fato. As profissionais dizem: “Não vamos compartilhar um único trecho deste texto porque ele todo fala por si. Fala pelo que a mulher ainda enfrenta dentro de uma redação. Fala pelo machismo que objetifica, reduz e faz adoecer. Fala por tudo aquilo que mostra que, sim, ainda há muito a ser feito e não, não vamos nos calar”, afirmou.

A nota expressa solidariedade às colegas do Correio Braziliense. “É emblemático que uma perversidade destas seja publicada por um editor em um dos periódicos mais tradicionais de Brasília — cidade onde o assédio ainda é tão presente nas relações com as fontes. É emblemático também que uma das primeiras pesquisas sobre assédio em redações brasileiras tenha sido conduzida pelo Sindicato dos Jornalistas do DF – segundo a qual quase 80% das jornalistas sofrem assédio moral no ambiente de trabalho. Pelo jeito, e a redação do Correio parece exemplificar isso, o campo a ser pesquisado é bem amplo.”, disseram. Jornalistas de outros veículos também repudiaram a crônica pelas redes sociais.

A crônica, publicada no Correio Braziliense (Imagem: reprodução)

Outro lado

Na manhã de terça-feira (12), Goulart divulgou nova coluna no Correio Braziliense intitulada “Crônica da Cidade: Um erro sem perdão”. No texto, o jornalista se desculpa pelo artigo. “A reação provocada pelos seis parágrafos que publiquei na segunda-feira aconteceu de uma forma que eu jamais poderia prever. E, se a crônica repercutiu assim, é porque falhei. Por isso, entendo, percebo, admito e reconheço a minha falta. Aceito a revolta e a indignação de todas as mensagens que recebi ontem por e-mail, por WhatsApp, pelo Facebook etc. Fiz questão de ler todas, do início ao fim. E peço as mais sinceras desculpas. Pois acredito que esse seja o melhor caminho para a transformação necessária para que as minhas filhas cresçam em um mundo em que não haja espaço para situações como a narrada por mim, nem textos equivocados como o meu”, afirma.

O jornalista também disse que o intuito da crônica era alertar para uma situação de abuso que ocorre dentro das redações, mas que não conseguiu passar essa mensagem. “Em ‘A estagiária’ tentei e não consegui mostrar algo que, todos os dias, pode acontecer em diversos ambientes. Infelizmente. Nesse caso, especificamente, criei uma personagem para mostrar que o problema do assédio às mulheres continua sendo uma realidade apavorante e assustadora — e é por isso que o problema deve, sim, ser abordado, apesar de eu tê-lo feito de forma totalmente equivocada”, disse.