“Bruno era ser humano da melhor qualidade”


29/06/2020


Bruno Liberati (Reprodução do Facebook)

O cartunista e ilustrador Bruno Liberati, morto no último dia 26, aos 71 anos, teve o dom de colecionar amigos ao longo da vida e nas diversas redações do país por onde passou, como Jornal da Tarde, Jornal do Brasil, O Estado de São Paulo e nas revistas Visão e Veja. “Bruno era ser humano da melhor qualidade”, resume a jornalista Regina Zappa, “Seu traço é luz, Liberati”, acrescenta o jornalista Carlos Franco, em sua homenagem:

De Regina Zappa: “Bruno Liberati era criativo, de humor fino, desenhista de mão cheia, apaixonado pela criação. Reproduzia o mundo com olhar leve e generoso nos seus desenhos. Suas caricaturas revelavam em traços precisos, harmoniosos e sutilmente bem-humorados a personalidade de seus caricaturados. Mas nada era superficial com ele. Os mergulhos na vida e no conhecimento eram sempre profundos. Bruno era ser humano da melhor qualidade. Generoso, inteligente, culto, talentoso, suave, delicado, engraçado. Pessoa das mais afáveis e gentis. Não há quem não reconheça sua excelência no desenho ou seu caráter exemplar. Para mim, Bruno era um amigo que me fez ver como amigos podem e devem ser.”

De Carlos Franco: “O legado que Bruno  Liberati nos deixa para a perenidade é o discurso sensível, doce, dos seus traços. Expressões que revelam a vivacidade de um olhar agudo e profundo sobre o mundo. Me lembro de quando ele deu asas ao Jamelão, no dia em que a voz do sambista emudeceu, ficou encantada. É Liberati que, agora, ganha asas, voa à Pasárgada de Manuel Bandeira, onde lá, tremendo boa praça que é, será amigo de todos e desenhará todos com a precisão dos seus traços, dos quais hoje nos sentimos órfãos. Abençoados órfãos que tivemos o prazer e o privilégio da convivência. Seu traço é luz, Liberati. Nos ilumina e alumeia”.

De Lula Palomares: “Tiu. Conheci o Bruno Liberati duas vezes. Eu explico: a primeira vez eu era ainda adolescente e via seus desenhos no Jornal do Brasil que meu tio João (esta palavra, tio, vai fazer todo sentido), deixava lá em casa quando ia nos visitar aos domingos. Meu pai comprava O Globo. Naquelas páginas, além do Bruno, eu conheci os desenhos do Lan, do Miguel (Agnus), do Ziraldo e mais tarde do Chico Caruso.

A segunda vez que o conheci foi quando em 1990 entrei para o time dos ilustradores do famoso JB. E lá permaneci durante sete anos trabalhando na mesa que ficava ao lado da do tio, ou TIU, como era conhecido carinhosamente por todos. Lembro que ele tinha o hábito de sempre mostrar o desenho que havia acabado de fazer para os colegas desenhistas antes de liberá-lo para o editor e a consequente publicação, apesar de ser o mais antigo e conhecido ilustrador da turma, ele talvez tenha sido o mais constante ilustrador da história do JB, assim como o Marcello Monteiro é para o Globo. Mas tinha esse gesto de amabilidade. Depois que algum desenho era entregue e à tarde as coisas ainda estavam um pouco mornas a gente subia ao sétimo andar na cantina pra tomar um café e falar de qualquer assunto mais íntimo e pessoal. O Bruno, além de tudo era um ótimo ouvinte.

Outra lembrança muito boa que guardo do Tiu, era quando, nos finais de semana em que ele estava com a Júlia, muitas vezes, ir lá em casa passar a tarde com a gente; eu era casado na época com a jornalista Sandra Medeiros que era muito sua amiga também. Ele levava a Júlia pra brincar com a Stephânia, filha da Sandra e nós passávamos a tarde conversando.

Depois que saí do jornal nos encontramos algumas vezes e de forma sempre muito amável e carinhosa, como era seu feitio com todos, conversávamos sobre os assuntos do dia, raramente sobre à época em que trabalhamos juntos. Eu não poderia nunca imaginar que o destino nos passaria essa rasteira.

Que Deus te receba e te abrigue no seu reino, meu amigo cético.”

De Chico Caruso: “Bom desenhista, amigo e companheiro, doce figura, com um sorriso permanente, Bruno Liberati vai nos fazer muita falta.”

De Joëlle Rouchou: “Falar do Bruno no passado é uma tarefa muito dura. Nos conhecemos na redação do Jornal do Brasil, final dos anos 70, início 80. Tímido, gentil, se divertia com as brincadeiras da redação do Caderno B do JB. Ele ficava numa bancada observando todos e fazendo sua arte que todos adorávamos bisbilhotar nas grandes folhas de papel sobre sua mesa. Emprestava livros de sociologia, com capa de papel pardo, pois ainda não havia liberdade para se desfilar com um livro do Gramsci, por exemplo. E assim explicava, com seu sorriso de menino, as contradições dos sistemas, a exploração da classe trabalhadora e a importância da resistência. Nada mais atual. Assim como ele era sempre um ser do seu tempo em seus desenhos, sua generosidade e as palavras de carinho que espalhou por muitos amigos e colegas. Voltávamos muito juntos, dava carona, falávamos de filmes juntamente com Clovis Marques e Claudia Maria Fonseca, um bonde que saía da sede da Av Brasil para a zona sul. E íamos ao cinema e líamos livros, ouvíamos músicas. Com o tempo, mesmo afastados, sempre tinha notícias dele, encontrava em bares e na PUC onde voltou a estudar. Um privilégio e uma honra ter conhecido, Bruno, o menino mais sensível, com seu sorriso largo e os olhinhos apertados de afeto.”

De Ruth Martins: “O traço artístico do Bruno Liberati era múltiplo: leve, colorido, ingênuo ou engraçado; ácido, preciso, clássico. Seja como ilustrador, desenhista, caricaturista brilhante, chargista ou pintor, seu traço era inconfundível. Era do Bruno.

Os traços do Bruno artista vão se mesclar em nossa memória afetiva ao melhor, ao mais marcante dos traços de sua personalidade, que tive a alegria de conhecer como colega de redação, namorada por alguns anos e amiga da vida inteira. Querido por todos, com a leveza que era tão dele e aquele sorrisinho que ele, timidamente, insistia em esconder. E que já nos faz tanta falta.”

De Christine Ajuz:  “Tive a felicidade de contar com o auxílio luxuoso de Bruno Liberati no Caderno de TV do Jornal do Brasil, que editei por dois anos (1982-83). Além de enriquecer o suplemento semanal com sua arte,  ele sempre trouxe alegria,  gentileza e apoio a toda equipe, sobretudo nos momentos de tensão ou dúvida.  Bruno era um amigo RECONFORTANTE, e deixa saudade imensa e eterna. ”

De Aliedo: “Com a aura de um “pastor” de excelência> Assim eu o via a ficar atento aos seus desenhos e aos dos outros colegas.  Como se para ele tudo fosse um grande rebanho onde se orgulhava de admirar, fazer parte e pastorear cada criação que surgia naquele nosso celeiro. Obrigado meu camarada!”

De Claudius: “Fiquei tristíssimo com a notícia. Bruno Liberati era uma pessoa querida por todos que o conheceram. Seu traço inconfundível era visto no Facebook em desenhos recuperados do baú da memória, com riqueza de detalhes. Sempre modesto, não parecia estar consciente de que era um dos grandes caricaturistas brasileiros. Que pena, que imensa tristeza!”

De Mariana Massarani:  “Primeiro conheci o Bruno pelos seus desenhos no JB. Lá em casa a gente assinava. Uma briga grande pelo Caderno B as 7 da manhã.

Um dia a a Marisa Scopel diagramadora, minha colega de gravura no MAM, conseguiu para mim uma entrevista com o Bruno Liberati.

Lá fui eu no incrível prédio da Av Brasil 500 com um portfolio debaixo do braço. Fui bem recebida pacas e logo comecei a ir as sextas feiras, dia de pescoção, desenhar com um monte de freelancers, além dos contratados. Quanta gente ilustrando lado a lado, um influenciando o outro, Aliedo, Lula, Édio Xavier, Cláudio Paiva, Bia Moreira Rocha, Soraia Magalhães, Angela Duque, Luiz da Costa, Alvinho, Chiquinho, Sizenando, Lapi, Gerardo Hanna etc… Nanquim, pena francesa Conté, ecolines e toneladas de papel Shoeller. O computador chegou bem depois, um Mac disputado a tapas.

O Bruno era o nosso editor de ilustração. Ainda tinha o Fernando Penna, Maraca e Fabio Dupin como editores de arte.

Aprendi tudo de desenho nessa redação. Foram 13 anos juntos. A gente ria pacas, sacaneava os outros, brigava e éramos muito felizes. Lamas depois do trabalho. Canja dividida e chopp. O Bruno era mais da Coca-Cola.

Minha melhor amiga Ana Mello Franco namorou ele, ontem quando nos  lembrávamos de mil estórias, falou: Ainda bem que a gente conheceu ele!”

De Aroeira: “Conheci o Bruno Liberati no Jornal do Brasil. E nunca mais passei sem ele… Seja no caderno B, nas páginas do JB, nas capas de livros, nos encontros da galera do desenho, nos esbarrões em vernissages e noites de autógrafos. Que delícia, ver o Bruno, sempre! E na sexta, dia 26 de junho deste terrível ano de 2020, o grande artista e amigo se foi de mansinho e deixou um buraco enorme. Aquele traço elegante, aquele talhe fino, aquele sujeito tão gentil, suave e culto não mora mais aqui. Mais uma tristeza enorme.”