Brasil exige fim da censura a Paulo Coelho no Irã


11/01/2011


O Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, confirmou nesta terça-feira, dia 11, que a Embaixada do Brasil no Irã está buscando informações sobre a decisão do país de proibir a circulação da obra do escritor Paulo Coelho:
—Queremos apurar exatamente a natureza da medida tomada. Faço minhas as palavras da Ministra da Cultura, Ana de Holanda, que diz que é contra a censura e a favor da liberdade de expressão, o que foi mencionado no discurso de posse da Presidente Dilma Rousseff.
 
Em visita ao complexo de favelas do Alemão, no Rio de Janeiro, nesta segunda-feira, dia 10, a Ministra da Cultura, Ana de Hollanda, comentou o episódio. “Acho lamentável qualquer tipo de censura”.
 
No domingo, dia 9, Paulo Coelho postou mensagem em seu blog afirmando que seus livros haviam sido censurados pelo Governo do Irã, e pediu ajuda ao Governo brasileiro para esclarecer o caso. O escritor também veiculou na rede o e-mail enviado por seu editor iraniano Arash Hejazi comunicando a decisão das autoridades iranianas. Hejazi atribui a informação a uma fonte do Ministério da Cultura e das Diretrizes Islâmicas.
 
Paulo Coelho ressaltou no blog que suas obras vem sendo publicadas no Irã desde 1998 em diferentes editoras, sempre aos cuidados do editor iraniano Arash Hejazi, e que já foram vendidos cerca de 6 milhões de exemplares no país. O autor classificou a decisão como uma ação arbitrária, que, após 12 anos, segundo ele, pode representar apenas um mal-entendido.
 
Os motivos que levaram à proibição determinada pelo Ministério da Cultura e das Diretrizes Islâmicas ainda não foram divulgados. Por causa da censura, Paulo Coelho autorizou Arash Hejazi a disponibilizar gratuitamente o conteúdo da obra em língua persa no formato e-books.
 
Hejazi relaciona a proibição das obras com o apoio que vem recebendo de Paulo Coelho. O editor é testemunha do assassinato de Neda Agha-Soltan, ocorrido em Teerã, em junho de 2009, durante os protestos contra a reeleição do Presidente Mahmoud Ahmadinedjad, acusado de fraude pela oposição.
 
Formado em Medicina, Hejazi estava ao lado de Neda no momento em que ela foi baleada, e pode ser visto tentando socorrê-la no vídeo que registrou a morte da ativista. As imagens ganharam repercussão mundial como símbolo da repressão no Irã. Perseguido, Hejazi buscou exilou em Londres, onde permanece até hoje. Sua editora, a Caravan Books, foi fechada pelo Governo iraniano em 2010.
 
—Parece que Paulo Coelho está pagando o preço por te me defendido naquela situação. Ele foi uma das primeiras pessoas a me identificar no vídeo. Paulo também já se manifestou a favor de Shirin Ebadi, a vencedora do Nobel da Paz de 2003, exilada por suas críticas à situação dos direitos humanos no Irã. Sua popularidade no país também pode ser uma questão. Minha experiência diz que este governo detesta qualquer um que é extremamente popular e não está sob seu controle – avalia Hejazi.
 
Nesta terça-feira, dia 11, Paulo Coelho agradeceu em seu blog as manifestações de apoio do Governo brasileiro e de leitores iranianos.  
 
Em entrevista ao ABI Online, o jornalista e escritor Fernando Moraes, autor de O Mago (2008), biografia de Paulo Coelho, sublinhou que não é a primeira vez que o escritor é censurado no Irã.
—Já enviei e-mail e telefonei para o Paulo Coelho me solidarizando e protestando contra a violência deste ato. Tudo indica ser uma retaliação do Governo iraniano à publicação no blog de Paulo Coelho de uma foto de seu editor, Arash Hejazi, socorrendo Neda Agha Soltan, após o seu sacrifício em público. Não é a primeira vez que isso acontece com o Paulo, no Irã. Em 2005, estávamos em Praga, e  recebemos um telefonema do Arash, de Teerã, informando que o Governo tinha apreendido mil exemplares do Zahir, recém lançado no Irã na época, antes de ser lançado no Brasil até. Imediatamente, Paulo Coelho ligou para a imprensa e divulgou o fato, e em pouco tempo, devolveram os livros, o que parece que não vai acontecer agora.
 
Moraes lembra que a censura a Paulo Coelho difere do contexto das relações Brasil-Irã:
—Além da brutalidade da atitude, tudo indica que desta vez a repercussão está sendo maior, por conta de toda essa divulgação na imprensa. É surpreendente que eles façam isto com o autor de um país que tem sido solidário diplomaticamente com o Irã, e que vendeu tanto por lá. O Irã só respeita direitos autorais de livros que tenham sua primeira edição publicada dentro do país, como uma forma de coibir a pirataria.
 
O acadêmico e jornalista Murilo Melo Filho considera a proibição como um ato desfavorável, em especial, à população iraniana:
—A proibição dos livros Paulo Coelho no território do Irã serve apenas como mais uma prova da violência que impera naquele país sob o comando de um presidente ditador e que deságua exatamente sobre os escritores intelectuais do seu país. Não é de admirar que ele faça voltar sobre os intelectuais do mundo toda a sua ira e o seu ódio à inteligência humana. O que ele faz é justamente sopitar as esperanças de liberdade do povo iraniano.
 
Para o poeta e escritor Ferreira Gullar, a decisão do Irã exprime o perfil ditatorial das autoridades do país: 
—Proibir livro é uma coisa inaceitável, mas no Irã, onde se mata mulher a pedradas, não é uma coisa incomum. O governo iraniano representa um regime execrado antes da idade média. É de se espantar que alguma literatura ocidental possa circular num regime obscurantista como o do Irã.
 
O ex-Presidente da ABL, jornalista Cícero Sandroni classificou o episódio como um atentado à cultura:
—Já enviei um e-mail ao Paulo Coelho registrando o meu repúdio particular, e acredito que de todos os membros da ABL, pela brutal medida do Governo iraniano. Considero uma censura inadmissível, principalmente levando em conta os livros do Paulo Coelho. Mais uma vez o Governo do Irã demonstra incapacidade de conviver com aqueles que produzem cultura e humanidade. Como jornalista, serei sempre contra qualquer tipo de censura, e considero simplesmente abominável a atitude do Governo do Irã.

O escritor e acadêmico Arnaldo Niskier também comentou o veto:
—Se os livros do Paulo Coelho circularam, com sucesso, tantos anos no Irã, por que só agora a proibição? Onde falta a democracia, exerce a plenitude, esses fatos ocorrem e são profundamente lamentáveis, por atentarem contra a liberdade de expressão.

*Colaboração: Renan Castro, estagiário do Departamento de Jornalismo da ABI.
 
Com informações Portal R7, O Globo.