Biblioteca ganha coleção de “Autores e Livros”


11/01/2008


A Biblioteca Bastos Tigre da ABI acaba de ganhar a coleção do suplemento literário “Autores e Livros”, que nos anos 40 circulava encartado no jornal A Manhã e era editado pelo escritor e acadêmico Múcio Leão, que ocupou a cadeira nº 20 da Academia Brasileira de Letras (ABL).

A coleção contém números seriados de “Autores e Livros” de 1941 a 1945, com pequenas falhas nos anos de 42, 43 e 44, e foi doada à Associação Brasileira de Imprensa por Paulo de Tarso de Oliveira, cuja família, formada por professores e pessoas ligadas à cultura, era quem colecionava o suplemento.

Segundo Paulo de Tarso quem começou a colecionar o caderno foi o seu avô Júlio Camargo Nogueira, pastor da Igreja Presbiteriana, que adorava a leitura de jornais e guardava as páginas literárias para as filhas professoras, que também gostavam muito de ler e se interessavam por literatura:
— Os meus familiares sempre foram ligados ao ensino e à cultura e me deram os jornais para guardar. Tudo começou com o meu avô, que era leitor assíduo do jornal A Manhã, O Jornal e Gazeta de Notícias. Eu tinha um escritório em casa, mas começou a dar cupim e eu fiquei sem condições para manter a coleção, sob o risco de perder tudo. Então numa conversa com o Maurício Azêdo (Presidente da ABI), ele demonstrou interesse nos suplementos para incrementar o acervo da biblioteca da ABI.

Paulo é membro da Associação Cultural de Vila Santa Rita, em Campo Grande (Zona Oeste), criada para funcionar como um braço comunitário da Associação de Moradores local:
— O nosso principal objetivo é levar a cultura para a juventude desinformada selecionando nos jornais os assuntos culturais e literários. O meu interesse por jornais começou com o incentivo de um colega que era politizado e me despertou para o que eu poderia aprender a partir da leitura da leitura dos periódicos. Adquiri alguns conhecimentos e passei a conversar sobre vários assuntos com qualquer pessoa. 

Caderno ilustrado

“Autores e livros” era impresso no formato standard, ilustrado com fotos e caricaturas de grandes escritores e poetas nacionais. Era um suplemento totalmente dedicado à literatura, falando sobre a vida e a obra de determinado escritor ou poeta, além dos textos de críticos literários sobre as obras dos autores destacados nas edições.

 Fagundes Varela

O exemplar nº 2 de “Autores e Livros” foi dedicado ao poeta Fagundes Varela. No editorial “O grande precursor”, publicado na primeira página do suplemento, Varela é saudado como pertencente à categoria dos poetas românticos, a exemplo de Castro Alves: “melhor dito, daqueles brasileiros cuja poesia romântica, por volta de meados do século XIX, condizia com os estados da alma do País”.

Segundo o editorial o que mais impressionava em Fagundes Varela é o drama do sentimento brasileiro, “procurando sua libertação expressional”, que, na opinião do caderno, começa a nascer no País com o nacionalismo que provocou a independência e a abdicação do absolutista D. Pedro I. 


Surpresas

O suplemento “Autores e Livros” era uma publicação que oferecia aos leitores uma edição ampla e variada de excelente substância literária. Em suas páginas figuravam contos, poemas e artigos de autores como Alphonsus de Guimaraens, Afonso Schmidt, além de estudos e crônicas de Adalgisa Nery, Antonio Austregésilo, Vinicius de Moraes, Raimundo Magalhães Júnior, Clementino Fraga e Pedro Calmon, entre outros.

Às vezes os leitores eram surpreendidos com textos inéditos, como a sextilha encontrada nos arquivos da ABL, que pertencera a Lúcio Mendonça, que não fora publicada até então em livro:

Eu sou pequena, trigueira
Como a rolinha faceira
Como a linda Iassanã.
Meus olhos negros esquivos
São mais brilhantes e vivos
Que os olhos da minha irmã (…)

                          Arthur Azevedo

Ou ainda o artigo autobiográfico de Arthur Azevedo contando sobre o seu desejo de se tornar um autor de teatro: “Desde os mais verdes anos, manifestei certa vocação para o teatro e, se não foram meus pais, teria com certeza abraçado a arte dramática”, escreveu o poeta.

Azevedo lembra que aos 8 anos de idade organizava “espetáculos de súcia” com os meninos da sua idade, e diz que ficava radiante de alegria todas as vezes que tinha acesso a uma comédia ou a um drama na biblioteca do pai, onde, segundo ele, encontravam-se bons livros, muitos em francês, idioma que aprendeu, desde cedo, a ler e a traduzir com facilidade.

No artigo Arthur Azevedo conta a sua própria história: “um comediógrafo sem teatro, sem artistas, sem público, que chegou infelizmente aos 47 anos (1941) sem realizar o seu sonho de literatura e arte”.