“Bandidos de toga e outros bandidos”


02/02/2012


Decano dos advogados trabalhistas do Rio de Janeiro, o advogado Benedito Calheiros Bomfim expressou em artigo na Revista de Direito do Trabalho, edição de 30 de novembro de 2011, seu repúdio aos juízes que, “traindo seu juramento”, “vendam sentenças, deixem-se corromper, pratiquem as mais variadas fraudes e atos de improbidade”.
Ex-Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho, Calheiros Bomfim expôs sua indignação no artigo “Bandidos de toga e outros bandidos”, transcrito a seguir.
“O fato de que no Brasil existem juízes corruptos (como, de resto, em todos países) é sabido, e os que não sabiam suspeitavam. Mas a circunstância de ter sido confirmado e reafirmado publicamente pela Ministra Eliana Calmon, Corregedora do Conselho Nacional de Justiça, está a merecer as considerações que ora nos permitimos fazer.
Ressalve-se desde  logo que os magistrados brasileiros, em sua imensa maioria, possuem excelente formação moral e ética, são honestos, dignos e dotados de espírito público. 
Pela alta relevância de sua função social e institucional, incumbidos da missão de julgar aqueles que a eles  submetem suas pendências de toda a natureza, inclusive familiares, alimentícias, patrimoniais e até envolvendo a liberdade individual, nosso ordenamento jurídico exige que  tenham reputação ilibada e notável saber jurídico.
Entre as prerrogativas, direitos e vantagens que lhes são asseguradas encontram-se vitaliciedade, elevado padrão salarial, inamovibilidade, aposentadoria com proventos integrais, mesmo quando, sob suspeita de improbidade, são afastados do cargo prisão    especial.
Como, pois, com a situação privilegiada  que desfrutam e a responsabilidade social e funcional de que estão investidos, compreender e admitir que, traindo seu juramento, ao em vez de servirem de exemplo, vendam sentenças, deixem-se corromper, pratiquem os mais variadas fraudes e atos de improbidade?
Não há como compará-los a bandidos, comuns dos quais, por sua marginalização, exclusão da sociedade e natureza, só se podem esperar ações delituosas, práticas criminosas, além de que não recebem dinheiro público. De causar admiração seria se agissem de forma diferente. Os bandidos e mafiosos de colarinho branco, conquanto não aufiram (mas se apropriam) de dinheiro do Tesouro, cometem delitos da maior gravidade contra a coletividade e a economia  do País, merecem ser punidos com o máximo rigor da lei, embora, lamentavelmente,  se beneficiem sempre da impunidade.
O verdadeiro bandido, este sim, é o juiz corrupto que, comprometendo a imagem de sua corporação, com a alta responsabilidade  que o Estado e a sociedade lhe conferem e com as condições privilegiadas em que vive, auferindo vencimentos superiores aos da quase totalidade dos seus colegas de categoria dos outros países, trai sua missão social de fazer justiça e seu juramento de  respeitar a Constituição e as leis do País, comete fraudes, desvia verba pública, comercializa sentença.
O autor das presentes observações é visceralmente contra a pena de morte. Entende que o Estado não deve punir o criminoso com outro crime, uma  morte com outra morte. A penalidade que aplica tem fim pedagógico, visa à ressocialização,  à reeducação, á reinserção do delinquente na sociedade. Mas se, por hipótese, fosse obrigado a admitir exceções  à tese contrária à pena capital (proibida em nossa Constituição),  seria para aplicar a pena de morte ao juiz corrupto, venal e ao  torturador.
Em alguns países o juiz é submetido ao voto popular ou é eleito pelo Parlamento, em outros o mandato tem duração temporária e em muitos são mal remunerados, se comparados com o padrão brasileiro.
Não há, pois, como tornar análogo o crime do juiz ao do bandido comum ou o de colarinho branco, nem tornar equivalente a pena aplicável a todos. Se, portanto, houve injustiça na afirmação da Ministra Eliana Calmon, certamente não foi com os bandidos de toga.”