Antonio Nascimento – Irreverência a serviço do esporte


22/07/2008


José Reinaldo Marques
25/07/2008

 

Há 12 anos chefiando a editoria de Esportes do Globo, Antonio Nascimento — ou Toninho, como é tratado pelos colegas — começou a carreira na televisão. Carioca, nascido em 6 de julho de 1960, em 84 ele estreava na Intervídeo, de Fernando Barbosa Lima, Roberto D’Ávila e Walter Salles Jr., como produtor do “Conexão internacional” e do “Programa de domingo”, que eram exibidos pela antiga Rede Manchete.

A relação profissional com o Globo teve início em 86, como redator de Esportes e, depois, subeditor de Esportes Olímpicos. Com a dissolução da União Soviética, de 90 a 92 foi editor da Internacional, de onde seguiu para o suplemento “Carro etc.”. Em 93, saiu do jornal:
— Voltei em 96, para assumir a editoria de Esportes, em que a equipe tem mais 15 pessoas: um editor-assistente, dois subeditores, um chefe de reportagem e onze repórteres. destes, quatro cuidam dos esportes olímpicos; um, do turfe; e seis, do futebol. Mas não temos exatamente posições fixas. Aqui, ao contrário do que ocorre normalmente em campo, goleiro vai para a área cabecear, presidente de clube bate pênalti…

Para Toninho, o segredo do sucesso profissional é ter dedicação ao que se faz:
— Acho fundamental ser apaixonado pela profissão e estar disposto a fazer muitos sacrifícios por ela. Outro trunfo é ler sempre mais. Nós jornalistas precisamos ser especialistas em tudo.

Ousadia

Toninho não tem dúvida de que ocupar a editoria de um veículo como O Globo — “pela credibilidade que o jornal tem” — é tarefa que exige muita responsabilidade e seriedade:
— Mas nada pode ser uma barreira para a criatividade e o direito de ousar. Tenho isso como um lema. Como se diz no hipismo, só não cai do cavalo quem não monta. Já sofri algumas fraturas — afirma o editor.

Descontração também é uma das principais características do time de Esportes do Globo:
— Trabalhamos com a paixão das pessoas e não podemos ser sisudos, chatos. Temos que ser sempre irreverentes, mas sem passar do limite. Uma das maiores dificuldades, principalmente no futebol, é lidar com a parcialidade dos leitores torcedores, que às vezes nos acusam de favorecer o adversário. É um desafio trabalhar numa área em que quase todos são passionais. Preciso manter uma certa neutralidade, como se fosse um islandês numa Copa do Mundo. Uma vez, no Maracanã, numa partida entre Vasco e Flamengo, fui esculhambado por vascaínos, que me acusavam de ser rubro-negro, e flamenguistas, que me chamavam de cruz-maltino. Eu sou Fluminense.

O outro lado da moeda, diz ele, é que o esporte permite ao jornalista ousar de vez em quando e tentar fazer cada edição do noticiário esportivo mais estimulante para o leitor:
— Minha maior gratificação é transformar idéias em coisas concretas, como desenhos de páginas, reportagens e furos. E, junto a isso, a liberdade que tenho para trabalhar com a minha equipe.

Olimpíadas

Às vésperas dos Jogos Olímpicos de Pequim, Toninho promete para o leitor do Globo uma cobertura diferenciada:
— Este evento traz um elemento extra: o local também é um personagem. É ótimo que o jornal tenha sido o primeiro a contar com um correspondente naquele país, o excelente Gilberto Scolfield Jr., que vai dar um brilho extra ao nosso trabalho, com os aspectos locais.

A internet também será uma ferramenta preciosa para a equipe:
— Estamos num momento extremamente instigante na relação com a web. Por isso, espero uma cobertura bem diferente das anteriores, com matérias analíticas e reportagens especiais. O varejo vai para a rede. E todos estão adorando esta mudança na forma de abordar um grande evento esportivo. Não quero de cada um seis matérias por dia; quero uma ótima matéria, diferente, interessante.

Em todos esses anos, Toninho jamais acompanhou in loco uma Copa ou Olimpíada. E explica por quê:
— Minha função é ficar aqui na redação, dando o melhor aproveitamento ao material que recebo de uma excepcional equipe. Sempre gostei do processo de edição, de organização, de orientação, sou assim desde a TV, onde comecei. Não tenho jeito para reportagem, nem nunca tive essa pretensão. Se tenho algum trunfo, é dar aos repórteres as melhores condições possíveis, a melhor estrutura, trabalhando ao máximo e estando sempre à disposição para sugerir idéias ou incentivar as deles. Um grande evento se ganha no local, mas pode se perder na redação. 

Deslumbramento

Em relação ao futebol, Toninho acha que a imprensa anda um pouco equivocada, elevando ao altar dos craques atletas com baixo nível técnico:
— Acho, e o Fernando Calazans é meu mestre nisso, que a cobertura esportiva anda um pouco deslumbrada — e tenho culpa no cartório. Qualquer cabeça-de-bagre passa a ser um fenômeno. Mas não considero que tudo o que aconteceu no passado foi genial e que o presente é todo ruim. Tento me manter entre os saudosistas e os eufóricos. Para mim, não existe uma cobertura unificada de esporte, ela depende do veículo. O Lance! precisa ser mais estridente; a Folha, mais sisuda; O Globo, mais bem-humorado; e assim por diante.

O nível dos jornalistas, porém, evoluiu muito, em sua opinião:
— Eles estão mais bem preparados culturalmente, o que se reflete nos textos. Dou um exemplo. O último dia 5 de julho marcou os 50 anos do primeiro título da Maria Esther Bueno em Wimbledon, em duplas. Fui ler o que O Globo tinha publicado na época e tomei um susto! A notícia dividia um alto de página com um torneio de cadetes de atletismo, o menor número de fotos era o do torneio de tênis e o texto era muito ruim.

Anistia

Entre as situações desagradáveis que já enfrentou na chefia do Esporte, Toninho destaca a proibição de repórteres e colunistas do Globo no Vasco, pelo então Presidente Eurico Miranda (o problema terminou com a posse de Roberto Dinamite no cargo). O ex-dirigente também se disse vítima de agressão no noticiário esportivo do jornal, em carta enviada ao editor:
— Não me abalei porque tenho certeza de que, juntamente com minha equipe, pratico um jornalismo ético. A citação na carta de despedida do Eurico foi incluída no meu currículo. E imagino que muitos editores da área tenham se rasgado de inveja. Falando sério, o Eurico, com sua prepotência, representou o pior autoritarismo possível, o mais retrógrado. Nos meus 12 anos à frente da editoria, ele foi o único a censurar a imprensa. De forma torpe, barrava nos treinos e jogos repórteres que escreviam qualquer coisa sobre o Vasco que não lhe agradasse. O Extra e o Lance! também enfrentaram esse problema.

Toninho faz questão de frisar o tratamento distinto dado pelo Globo a Eurico Miranda e seu clube:
— Sempre soubemos separar os dois em nosso noticiário. As notícias da CPI em Brasília, por exemplo, não eram publicadas nas páginas dedicadas ao futebol. O Vasco é, e sempre foi, muito maior que seu ex-Presidente. 

Ira 

Outra polêmica em que o editor se viu envolvido foi uma capa do caderno de Esportes do ano passado, após uma derrota do Sport para o Fluminense, por 3 a 1, em jogo realizado no campo do clube de Recife. Com um leão (símbolo do Sport), vinham o título “Animador de festas” e o texto: “Se você, torcedor carioca, precisa de alguém para animar a festa do seu clube, chama o Sport. O time garante a alegria de qualquer evento.” A página provocou a ira de dirigentes e torcedores do clube pernambucano e deixou Toninho numa situação embaraçosa:
— Foi um momento extremamente delicado, pois sofri ameaças, assim como a minha família. A reação de alguns torcedores do Sport foi incentivada por dirigentes e por radialistas locais, como o jornal explicou em nota da página 6, poucos dias após a publicação da capa. Essa é uma das fraturas que sofri na carreira. Mas não abro mão do humor, principalmente nas capas do caderno esportivo. Uma delas, por sinal, deu a mim e aos colegas Telio Navega, Marcelo Monteiro e Alessandro Alvim o Prêmio Esso de 2006. A página mostrava o bonequinho que era o mascote brasileiro indo embora, após a derrota do Brasil para a França no Mundial da Alemanha.