Advogados denunciam abuso de autoridade


12/05/2010


Vítimas de ofensas sofridas em pleno exercício da atividade profissional, os advogados Eurivaldo Neves Bezerra e Benigna Augusta da Silva Nunes entraram com representações na Ordem dos Advogados do Brasil. Ele contra a Juíza federal Márcia Helena Luz, ela contra delegada Valéria de Aragão Sadio, da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Propriedade Imaterial. Após analisar as denúncias e deferir os seus processos, a entidade os acolheu em Sessão Solene de Desagravo, realizada na sede da Ordem do Rio de Janeiro.

Eurivaldo Neves Bezerra disse que em 18 anos de profissão nunca tinha passado por tamanha humilhação. Contou que o agravo que sofreu foi uma ofensa proferida pela Juíza Federal, Márcia Helena Luz, que, ao contestar os termos de uma Ação Ordinária impetrada pelo escritório que representa, teria usado palavras ofensivas à sua integridade intelectual e profissional:
— Em seu despacho, ao se referir aos termos da petição, a juíza escreveu que a ação só poderia ser objeto de um advogado despreparado. Não posso reproduzir exatamente as suas palavras, mas ela me chamou textualmente de burro, denegrindo a minha imagem e a do escritório que eu represento, afirmou Eurivaldo.

Segundo o advogado, o motivo que o levou a encaminhar queixa à OAB foi o fato de constatar que falta decoro profissional a alguns juizes:
— Eu devo respeitá-los (juizes), mas eles também me devem respeito. Eu encaminhei a minha queixa à OAB para que se tomem providências, no sentido de que os magistrados meçam as suas palavras ao se reportarem aos advogados ou a qualquer outra pessoa. A minha atitude é para incentivar que ninguém aceite esse tipo de abuso que um juiz venha a cometer.

Ditadura

“Eu me senti como se estivesse vivendo o período da ditadura no Brasil, depois do golpe militar de 1964”. Esta foi a maneira encontrada pela advogada Benigna Augusta da Silva Nunes, para explicar o trauma que sofreu em função dos agravos a que foi submetida pela delegada Valéria de Aragão Sadio, da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Propriedade Imaterial.

Benigna Augusta da Silva Nunes em razão da violação dos seus direitos advocatícios devido ao arrombamento, sem justa causa, do seu escritório na Avenida Presidente Vargas (Centro), numa ação policial comandada pela delegada Valéria, sob a suspeita de fazer parte de um esquema de contravenção de mercadorias contrabandeadas.

A Dra. Benigna Augusta Nunes contou ao ABI Online que estava viajando no momento em que a polícia invadiu o seu escritório. Ao retornar, tomou um susto ao deparar-se com o arrombamento. Disse que imediatamente procurou o síndico do prédio, que lhe relatou o ocorrido. Mais tarde, quando conseguiu entrar na sala, constatou que durante a ação policial tinham sido levados alguns pertences pessoais, como jóias, e um computador.

A advogada disse que foi procurar a delegada que lhe devolveu as jóias, mas se negou a devolver o computador alegando que continuava sob investigação. Na realidade, a advogada Benigna Nunes foi vítima de um erro policial, conforme lhe relatou a própria delegada Valéria dizendo que há tempos a polícia estava fazendo escutas telefônicas de um escritório colado ao seu. 

A advogada então pediu para ouvir o conteúdo das gravações, mas teve o seu pedido negado pela delegada Valéria sob a alegação que o material fazia parte de um processo que estava sob segredo de Justiça. Foi então que tomou conhecimento que o caso tinha ligações com uma investigação sobre mercadorias contrabandeadas, que vinha sendo feita com a ajuda da polícia de São Paulo, e que já havia um processo em curso tramitando na 11ª Vara Criminal Federal de Busca e Apreensão, no Rio.

Choque

Como foi obrigada a prestar depoimento na delegacia, Benigna Nunes na condição de testemunha passou a ter acesso ao processo, e foi então que descobriu que seu nome nem era citado na investigação:
— O meu nome não estava declinado, não havia nem mandado de busca e apreensão para o meu escritório. Até hoje eu não sei o que houve. Mas posso afirmar que foi um fato chocante. É uma marca que vai ficar. Me senti como uma pessoa que é assaltada. Trata-se de um episódio que não corresponde com o nosso Estado Democrático de Direito como cidadã e como advogada, que prescreve a não violação do domicílio do local de trabalho. É um caso que está muito fora da realidade e por isso eu achei um absurdo.

Segundo o Secretário Geral da OAB-RJ, Marcos Luiz Oliveira de Souza, “esses casos não são comuns e menos raros do que nós gostaríamos que fossem”. De acordo com o advogado o caso da Dra. Benigna Nunes foi muito grave, porque além do arrombamento do seu escritório sem razão aparente houve a subtração de objetos pessoais:
— Casos de desagravo merecem sempre muita atenção da OAB, abrimos este processo porque o agravo sofrido pela Dra. Benigna foi um atentado contra um advogado no exercício da profissão que fere o princípio da inviolabilidade. Não podemos abrir mão dessa prerrogativa que não é apenas do advogado é da cidadania.

De acordo com o Secretário Geral da OAB-RJ essa prerrogativa de inviolabilidade do escritório de um advogado é a garantia e o respaldo do direito de defesa de um cliente. De acordo com Marcos Luiz se um advogado guarda documentos sigilosos em seu escritório, “até mesmo sobre processos criminais”, o faz com garantia ao seu cliente que lhe confia as informações.

Para a OAB, o caso da Dra. Benigna, além do abuso de autoridade praticado pela delegada, mostra que houve também o agravo de desrespeito à inviolabilidade da figura do advogado junto ao seu cliente, questão que é um dos pilares do Estado de Direito Democrático previsto na Constituição e nos estatutos advocatícios:
— A OAB trata de casos de desagravo com muita cautela, só deferimos esses processos quando extrapolam a ofensa do ofendido, ou seja, ofende toda a advocacia, quando ameaça os princípios do exercício da advocacia, que são a autonomia, independência e a coragem de agir sem receio de desagradar a quem quer que seja.