ABI vai ao STF contra André Esteves e Roberto Campos Neto


11/11/2021


A ABI requer que seja instaurado inquérito para verificação de possível ocorrência de crime. Segundo Esteves, o presidente do Banco Central do Brasil, teria o consultado sobre quais políticas monetárias ele acreditava ser mais acertadas, mais exatamente sobre a queda na taxa de juros (Selic) e acerca do lower bound dos juros (conceito econômico que descreve a menor taxa de juros possível em uma economia). 

Veja abaixo, noticia protocolada junto ao STF:

 Ao Excelentíssimo Senhor Ministro Luiz Fux, Presidente do Supremo Tribunal Federal 

Associação Brasileira de Imprensa – ABI, entidade de classe com abrangência nacional e pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o número 34.058.917/0001-69, com sede na Rua Araújo Porto Alegre, 71, Centro, Rio de Janeiro/RJ, CEP 20030-012, e-mail presidencia@abi.org.br, telefone: (21) 2282-1292, vem, através de seu presidente, apresentar Notícia de potencial conduta lesiva à confiabilidade do mercado de capitais, na qual figuram como possíveis envolvidos os senhores André Santos Esteves e Roberto Campos Neto, conforme os fatos e os argumentos jurídicos adiante assinalados. 

1 – Os fatos 

Como amplamente divulgado pelos meios de comunicação, o senhor André Santos Esteves, sócio sênior do Banco BTG Pactual, em palestra recentemente ofertada para clientes e investidores de seu banco, declarou que teria recebido telefonema do senhor Roberto Campos Neto, atual presidente do Banco Central do Brasil1. 

1 Amostragem da repercussão midiática em anexo. 

Segundo Esteves, o presidente do Banco Central do Brasil, teria o consultado sobre quais políticas monetárias ele acreditava ser mais acertadas, mais exatamente sobre a queda na taxa de juros (Selic) e acerca do lower bound dos juros (conceito econômico que descreve a menor taxa de juros possível em uma economia). 

Vejamos o que falou Esteves sobre o telefonema recebido: 

“E eu me lembro que o juros estava assim em uns 3,5% e o Roberto me ligou para perguntar: ‘Pô, André, o que você está achando disso, onde você acha que está o lower bound?’. Eu falei assim: ‘olha, Roberto, eu não sei onde que está, mas eu estou vendo pelo retrovisor, porque a gente já passou por ele. Acho que, em algum momento, a gente se achou inglês demais e levamos esse juros para 2%, o que eu acho que é um pouquinho fora de apreço. Acho que a gente não comporta ainda esse juros”2. 

2 O áudio integral da palestra está disposto na Rede Social YouTube, https://www.youtube.com/watch?v=vwrSOb3m3sE&t=1669s, e o trecho transcrito corresponde ao intervalo entre 11min e 52s e 12min e 26s. 

Obviamente, o administrador pode consultar a sociedade sobre determinados temas sob seu cuidado, porém, nunca de maneira informal ou adiantando sua compreensão sobre eles para aqueles cuja atividade está diretamente implicada por suas decisões. Da mesma forma, não cabe ao administrador pedir aconselhamentos oficiosos daqueles cujas atividades são frontalmente afetadas por suas decisões. 

Por isso, entendemos haver indícios de que a conduta dos envolvidos é potencialmente lesiva à confiabilidade do mercado de capitais. 

2 – Os argumentos jurídicos 

Um dos mecanismos de proteção da confiabilidade do mercado de capitais brasileiro é a proibição prevista no artigo 27-D da Lei 6.385/76, conhecida pela expressão inglesa de Insider Trading: 

“Art. 27-D. Utilizar informação relevante de que tenha conhecimento, ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiros, de valores mobiliários: (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017) 

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 31.10.2001) 

§ 1º Incorre na mesma pena quem repassa informação sigilosa relativa a fato relevante a que tenha tido acesso em razão de cargo ou posição que ocupe em emissor de valores mobiliários ou em razão de relação comercial, profissional ou de confiança com o emissor. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017) 

§ 2º A pena é aumentada em 1/3 (um terço) se o agente comete o crime previsto no caput deste artigo valendo-se de informação relevante de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)”. 

O dispositivo legal em questão busca evitar a utilização e o repasse de informações relevantes, ainda não amplamente conhecidas, para fins de auferimento de lucro ou outra vantagem mediante sua operacionalização junto ao mercado de capitais. 

Portanto, quando autoridades responsáveis por políticas monetárias e de capitais adiantam suas posições para operadores destes mercados, elas podem, eventualmente, incorrer na hipótese prevista no parágrafo primeiro, do artigo 27-D, da Lei 6.385/76. Da mesma forma, quando operadores desses mercado utilizam informações prestadas indevidamente por tais autoridades, eles podem incidir na hipótese prevista na cabeça do mesmo artigo. 

3 – O pedido 

Diante de tudo o acima exposto, a ABI requer, após distribuição desta para um Ministro Relator e oitiva do Ministério Público Federal, seja instaurado inquérito para verificação de possível ocorrência do crime previsto no artigo 27-D da Lei 6.385/76 ou outro crime ou desvio administrativo que entenda o Parquet mais pertinente aos fatos em questão. 

Nestes Termos, 

Pede Deferimento. Rio de Janeiro, 09 de novembro de 2021. Paulo Jeronimo de Sousa Presidente da ABI Luís Guilherme Vieira OAB/RJ nº OAB 49.265 Ítalo Pires Aguiar OAB/RJ nº 163402