ABI celebra memória dos jornalistas Vladimir Herzog
e Maurício Azêdo


27/10/2015


Na tarde deste segunda-feira, dia 26, a Diretoria da Associação Brasileira de Imprensa prestou uma homenagem póstuma a Vladimir Herzog, assassinado há 40 anos, nas dependências do DOI-Codi de São Paulo, e lembrou os dois anos da morte do ex-presidente Maurício Azêdo, que comandou a ABI entre 2004 e 2013.

O dia 25 de outubro passou a ser uma data histórica na vida da ABI. Nesse mesmo dia morreram os jornalistas Vladimir Herzog e Oscar Maurício de Lima Azêdo.

MauricioAzedo

Oscar Maurício de Lima Azêdo, cujo nome foi abreviado na vida profissional de jornalista e na vida pública para Maurício Azêdo, é carioca nascido no bairro de Laranjeiras e criado no de Catumbi, onde passou boa parte da infância e da juventude. Jornalista, advogado, vereador, conselheiro do Tribunal de Contas do Município, dirigente sindical, presidente da Associação Brasileira de Imprensa desde 2004. No jornalismo, a grande paixão, o carioca Maurício Azêdo passou por quase todas as funções nas redações de alguns dos jornais e revistas mais importantes do país. Trabalhou também em programas de televisão e de rádio. Defensor da liberdade de expressão, foi colaborador de jornais alternativos de resistência durante a ditadura militar, a segurança dos jornalistas foi uma das principais causas da sua gestão na Associação Brasileira de Imprensa

Maurício Azêdo se formou em 1960 na Turma Roberto Lyra da Faculdade de Direito do Catete, mas preferiu continuar na atividade jornalística, na qual se iniciara no terceiro ano do curso acadêmico.

Seu currículo como jornalista inclui o exercício da atividade de repórter, redator, cronista, editor, chefe de reportagem, editor-chefe e diretor de redação de inúmeros veículos, como o Jornal do CommercioDiário CariocaJornal do BrasilDiário de NotíciasJornal dos SportsÚltima HoraO DiaO Estado de S.PauloFolha de S.Paulo, entre outros jornais diários, O Semanário e as revistas MancheteFatos & FotosPais & FilhosRealidadePlacar, cuja criação foi baseada em projeto de sua autoria e da qual foi o primeiro editor-chefe, TV Guia e Carícia. Foi também colaborador de jornais alternativos de resistência à ditadura militar (1964-1985), como a Folha da Semana, periódico criado pelo Partido Comunista Brasileiro-PCB, que circulou entre 2 de setembro de 1965 e 13 de dezembro de 1966, quando o Ministro da Justiça do Governo Castelo Branco, Carlos Medeiros Silva, editou uma portaria proibindo a sua impressão, distribuição e circulação em todo o território nacional, como dizia com ênfase o ato castrador. Nos anos 70, Maurício trabalhou como repórter, editor ou cronista em Opinião, Movimento e Hora do Povo, entre outros jornais. Foi colaborador do jornal clandestino Voz Operária, órgão do Comitê Central do PCB.

Maurício teve atuação episódica em veículos eletrônicos de comunicação, atuando como redator do programa “Expresso das 7h30”, noticioso pioneiro nos informativos matutinos da televisão, transmitido pela TV Continental, Canal 9 do Rio de Janeiro, em 1966, e como comentarista político no programa “Falando grosso”, da Rádio FM O Dia, em 1994. Antes de sua profissionalização, como noticiarista do Jornal do Commercio, em maio de 1958, pela mão do festejado jornalista Luís Paulistano, Maurício trabalhou 23 dias como repórter e noticiarista do estridente noticioso radiofônico “O Jornal do Brasil informa”, editado e dirigido pelo jornalista Maurítônio Meira. Foi Paulistano que o indicou a Mauritônio, do qual o arrebatou assim que se abriu a primeira vaga no JC, cuja redação Paulistano então dirigia.

Nos anos 70, Maurício Azêdo foi o principal editor do antigo Boletim ABI, que se constituiu num dos mais vigorosos e corajosos jornais de contestação do regime militar no campo das liberdades públicas, dos direitos civis e dos direitos humanos. Além de promover em sucessivas edições a denúncia do assassinato do jornalista Vladimir Herzog nas masmorras do Doi-Codi do II Exército, em São Paulo, em 25 de outubro de 1975. o Boletim ABI divulgou em quatro páginas inteiras de uma edição em tamanho standard, em outubro de 1978. a íntegra da decisão em que o Juiz Márcio José de Souza condenou a União a indenizar a viúva de Vlado, Clarisse Herzog, como responsável pela morte do jornalista. Integravam na época a equipe do Boletim ABI os associados Fichel Davit Chargel, Domingos Meirelles, Ronaldo Buarque de Holanda, Arthur Cantalice, Luiz Arthur Toríbio, Lúcia Toríbio, Carlos Jurandir Monteiro Lopes e Luiz Paulo Machado, entre outros. Na gestão Prudente de Morais, neto, Maurício Azêdo liderou esse grupo em 1975-1976 nos trabalhos de reabertura e reorganização da Biblioteca da ABI (Biblioteca Bastos Tigre), que fora fechada nos anos 60, na gestão Celso Kelly, para locação do pavimento que ocupava, e seu acervo confinado num cercado no saguão do nono andar do Edifício Herbert Moses e em desvãos entre pavimentos pouco usados.

Autor com o jornalista Fausto Neto da autobiografia do jogador de futebol Almir Albuquerque, o Almir Pernambuquinho, publicada originalmente como uma série de reportagens da revistaPlacar e depois editada em livro pela Editora Abril, em 1975, Maurício Azêdo publicou em 1982 o estudo “Estrutura do mercado de trabalho e perfil salarial dos jornalistas”, do Município do Rio de Janeiro, em colaboração com Fichel Davit Chargel; A Situação das Bibliotecas do Rio de Janeiro, publicado pela Câmara Municipal em 1984, reunindo as intervenções do seminário sobre o tema realizado pela Câmara por sua iniciativa e sob sua coordenação; “A Cabanagem — Uma guerra popular na Amazônia”, em “Os enigmas de nossa História”, Rio de Janeiro, Otto Pierre Editores Ltda, 1982. A convite do jornalista e escritor Mário Filho, fez a revisão tipográfica do livro de sua autoria “Viagem em torno de Pelé”, Rio de Janeiro, 1963.

Maurício foi o autor, nesse ano de 1963, do primeiro style book (manual de redação) do Jornal dos Sports, o qual, além de implantar as normas de redação do jornal, procedeu ao aportuguesamento das denominações das modalidades esportivas e seus eventos, até então grafadas em inglês pelo JS, que em vez de anunciar o match passou a anunciar o “jogo”. Foi também o introdutor da lauda diagramada de redação dos textos do jornal, em substituição âs tiras de aparas de bobinas do papel de impressão do jornal. Como só essa lauda era distribuída na redação, o cronista Nélson Rodrigues e o colunista Luiz Bayer, que resistiam à inovação, batiam seus textos no verso da lauda.

Com atuação na área cultural, Maurício Azêdo foi um dos fundadores e diretores do Cineclube Macunaíma, que realizou sessões e atividades culturais na ABI de 1973 a 1985. Para divulgação do cinema brasileiro criou o periódico Ganga Bruta, de que houve apenas duas edições, e foi editor da revista LuzCâmera e Ação, revista da Cooperativa Brasileira de Cinema dirigida por Marcos Farias e que teve vida curta, assim como a Cooperativa. Foi o redator, junto com o cineasta Iberê Cavalcânti, da “Carta de Curitiba”, aprovada na Jornada Nacional de Cineclubes realizada em Curitiba-PR, em 1974, a qual definiu a defesa e divulgação do cinema brasileiro como a principal tarefa cultural e políica do movimento cineclubista. Como diretor do Macunaíma, Maurício participou em 1976 da produção de dois documentários de curta-metragem: “É preciso botar peito”, de Rogério Lima, e “E aí a gente paramos”, de Julius Worcman. Ambos os documentários tinham tema comum: uma greve de trocadores e motoristas de ônibus do Rio de Janeiro, a primeira realizada na cidade sob o regime militar.

A partir de 1982 Maurício Azêdo dedicou-se à vida pública. Vereador à Câmara Municipal do Rio de Janeiro por três legislaturas (1983-88, 1989-1992, 1993-1996), foi Prefeito interino em exercício do Rio por oito dias (15-22/3/83), Presidente da Câmara Municipal no biênio 1983-85, Secretário Municipal de Desenvolvimento Social (1986-1987) e, de 1999 a 2004, Conselheiro do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro, no qual foi aposentado compulsoriamente por limite de idade em setembro de 2004. É autor de mais de cem leis municipais, entre as quais a de criação da Distribuidora de Filmes S/A (Riofilme), cujo projeto foi assinado pelo ator e então Vereador Francisco Milani (PCB). Foi também destacada a sua participação na elaboração da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, de 1990, e do Plano Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro, de 1992.

Entre as distinções que recebeu figuram a Medalha de Mérito Pedro Ernesto, da Câmara Municipal do Rio de Janeiro; a Medalha Tiradentes, da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; o Colar Victor Nunes Leal, do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro, e o Colar do Mérito Judiciário, conferido em dezembro de 2005 pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Maurício Azêdo foi eleito Presidente da ABI em abril de 2004, encabeçando a Chapa Prudente de Moraes, neto, de oposição à Diretoria então liderada por Fernando Segismundo, e empossado em 13 de maio seguinte. Em abril de 2007 foi reeleito para outro mandato de três anos. Entre uma eleição e outra, promoveu a unificação das principais correntes internas da ABI, convidando Fernando Segismundo a integrar a Chapa Prudente de Moraes, novamente vitoriosa. Por proposta de Maurício, Segismundo foi eleito Presidente do Conselho Deliberativo, cargo a que não concorreu para mais um mandato por motivo de saúde.

Maurício morreu em dia 25 outubro de 2013, aos 79 anos. Ele estava internado desde o dia 9 de outubro e apresentava um quadro de insuficiência cardíaca grave.

 

JORNALISTA VLADIMIR HERZOG

Vlado Herzog nasceu em Osijek na Iugoslávia em 27 de junho de 1937 e se mudou para o Brasil com a família para fugir da perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Naturalizado brasileiro, mudou seu nome para Vladimir.

Vlado se formou em Filosofia pela Universidade de São Paulo em 1959 e, desde então, exerceu a atividade jornalística em diferentes veículos de imprensa e também no cinema. Ele iniciou a carreira jornalística como repórter do jornal O Estado e S. Paulo e participou do grupo responsável pela instalação da sucursal de Brasília do jornal. Em 1962, conheceu a estudante de ciências sociais Clarice Chaves, com quem iria se casar em fevereiro de 1964, cerca de dois meses do golpe militar.

Em 1963, filmou no Rio de Janeiro o documentário “Marimbás” , primeiro filme brasileiro a utilizar som direto. Em 1965, gerenciou a  produção do curta-metragem “Subterrâneos do Futebol”, de Maurice Capovilla; e o início do roteiro do filme “Doramundo”, que só viria a ser filmado depois da morte dele por João Batista de Andrade. O mesmo cineasta homenageou Vlado com um documentário 30 anos depois.

Entre as primeiras consequências do regime militar na vida do casal, está a ida para Londres em 1965 onde Vlado foi contratado pela BBC. Na Inglaterra, nasceram os filhos do casal, Ivo e André. Ele voltou ao Brasil em 1968 e passa a atuar como editor da revista Visão. Em 1972, trabalhou pela primeira vez na TV Cultura.

Ele era diretor do telejornal “Hora da Notícia”, veiculado pela TV Cultura de São Paulo, quando foi morto sob tortura em 25 de outubro de 1975, pelos militares após ser detido nas dependências do Destacamento de Operação de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOPS/SP) . Ele deixou viúva a esposa Clarice, com os dois filhos do casal, Ivo, na época com 9 anos, e André, com 7.

A comoção causada pela morte do jornalista reaglutinou diversos setores da sociedade e provocou a primeira reação popular contra os excessos do regime militar. Por esse motivo, a data de morte foi escolhida para celebrar a democracia no país, sendo considerada o “Dia da Democracia”.

Um marco desse processo foi o ato ecumêmico realizado na Catedral da Sé. Realizado cerca de uma semana após a morte de Herzog, o ato, que  teve a presença do rabino Henry Sobel e do arcebispo de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, reuniu milhares de pessoas para homenagear o jornalista, em um protesto silencioso contra o regime.