A TV Pública em pauta na ABI


12/05/2009


                                                                                          Bernardo Costa

Mário Augusto Jakobiskind, Tereza Cruvinel e o Presidente da ABI, Maurício Azêdo

Jornalistas, cineastas, produtores culturais, estudantes, sócios e conselheiros da ABI, além do público em geral, lotaram a Sala Belisário de Souza, localizada no 7º andar do edifício-sede da Associação, no Centro do Rio, na noite desta segunda-feira, dia 11, durante o debate “A importância da TV Pública para a democratização dos meios de comunicação”, com a jornalista Tereza Cruvinel, Presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

 Maurício Azêdo

O encontro foi aberto com a saudação de Maurício Azêdo aos presentes e, em especial, à Presidente da EBC.
— Tereza Cruvinel, como profissional de imprensa é merecedora da nossa admiração pela competência e pelo alto sentido ético com que tem feito jornalismo. Gostaria de agradecer a sua disposição de comparecer à ABI, a Casa dos Jornalistas, para um debate franco em relação a questões tão importantes como aquelas relacionadas com a TV Pública, que pode se constituir, com o decorrer do tempo, em forte instrumento de democratização da informação e da opinião no Brasil.

Tereza agradeceu a oportunidade de discutir temas relevantes à imprensa nacional e destacou a importância em participar do evento na ABI:
— Mais do que como Presidente da EBC, é como jornalista que eu tenho muita alegria e especial emoção de estar aqui na Casa do Jornalista, como disse Azêdo. Casa de Barbosa Lima Sobrinho, Casa que eu freqüentei na juventude, como estudante, como militante pela redemocratização. Muito antes de ser jornalista eu já freqüentava a ABI. Ao longo dos meus 25 anos de jornalismo político, o tempo todo estivemos juntos, não só como jornalistas, mas acompanhando a presença da Associação nas lutas democráticas, como em 1976, no episódio da explosão da bomba, que eu cobri. Lembro perfeitamente da tarde em que Barbosa Lima Sobrinho, juntamente com o então Presidente da OAB, entrou no Salão Verde da Câmara com o pedido do impeachment de Fernando Collor.

Tereza iniciou a palestra recordando a história da radiodifusão na Europa e no Brasil:
— Nos anos 50, os governos dos estados nacionais europeus criaram as primeiras emissoras de rádio e televisão, que ganharam natureza pública no sentido do controle social. No Brasil, embora o Presidente Getúlio Vargas tenha tido a iniciativa de criar a Rádio Nacional, a primeira emissora de grande projeção, e também um projeto para a TV nacional, foi Assis Chateaubriand quem ganhou a primeira concessão de TV. Portanto, no Brasil, começamos tendo apenas uma TV comercial no modelo americano, no qual a publicidade financia e a audiência está subordinada a esta lógica. Em 21 de abril de 1960, com a inauguração de Brasília, Juscelino desengavetou o projeto de Getúlio Vargas e criou a TV Nacional de Brasília, hoje canal da TV Brasil.

O projeto para uma rede de TV pública ganhou força no País, segundo Tereza, na década de 80, durante a Constituinte, com o apoio de parlamentares, jornalistas e instituições:
— Entre aqueles que abraçaram esta luta, aproveito para homenagear a memória da Deputada e jornalista Cristina Tavares, da qual sou biógrafa. Cito também o jornalista e Deputado Miro Teixeira, a ABI, o Sindicato dos Jornalistas, e outras dezenas de entidades, e acadêmicos que participaram do movimento pela criação de uma TV pública e de uma dimensão democrática para o sistema de radiodifusão. Nós que cobrimos a Constituinte sabemos que ela é avançada em alguns pontos, mas que sofreu o impacto das forças conservadoras do chamado Centrão, que impedia que a esquerda, liderada por Mário Covas, conquistasse muitas mudanças. Não conseguimos naquele momento criar o sistema público de TV, mas aprovamos o artigo 223, que assegura ao poder constitutivo conceder, designar os canais de rádio e televisão, observando a complementaridade entre o sistema privado, e o estatal, público. Desde então, muitas televisões estatais foram criadas. Vinte anos se passaram sem que este artigo promovesse mudanças no sistema de radiodifusão brasileira, que continuava sendo exclusivamente privado, concentrado nas mãos de poucos grupos, o que uma democracia não permite neste grau registrado no Brasil. 

Democratização

Em 2007, destacou a Presidente da EBC, foi retomada a luta pela democratização do sistema de radiodifusão, com o Fórum da TV Pública, que reuniu um conjunto de entidades e pessoas, sob a liderança do Ministro Gilberto Gil. O encontro resultou na Carta de Brasília, que pedia a implantação do sistema público de radiodifusão:
—O Presidente Luis Inácio Lula da Silva implantou a Carta de Brasília, através do Ministro Franklin Martins. Eu recebi o convite para dirigir a EBC. Abri mão de uma trajetória profissional consolidada para construir algo inexistente. Um projeto duradouro, de interesse público, de contribuição à democracia. Me afastei daquilo que mais me mobiliza na vida que é a relação cotidiana com a notícia. Mas para fazer a TV Brasil.

                           Tereza Cruvinal

Segundo Tereza, até abril de 2008, a luta pela construção da TV Brasil foi travada no Congresso e junto à sociedade, para conquistar o debate político. As questões burocráticas, como a incorporação da Radiobrás e a estruturação da EBC foram tratadas adiante, até o mês de junho. Em seguida, teve início o projeto de construção da nova programação da emissora:
— Em 2 de dezembro de 2007, a TV Brasil entrou no ar com o novo nome. No dia seguinte, estreamos a edição noturna do telejornal “Repórter Brasil”, e, pouco depois, a edição da manhã. Sempre entendemos que o direito à informação é um dos compromissos inalienáveis de uma TV pública. O nosso objetivo é fazer um jornal que revele a diversidade do Brasil, deixando de expressá-lo apenas com imagens de Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. E caracterizando na TV Pública as noções de isenção, pluralidade, diversidade.

Na programação, sublinhou a jornalista, a meta é alcançar a função educativa no sentido amplo, contribuir para a formação crítica do cidadão, e evitar o que é feito na TV comercial.
— No ano passado, pela primeira vez uma televisão cobriu as festas juninas do Nordeste, expressão forte de nossa diversidade cultural. A programação da TV Brasil vai expressar etnias, ecologia. Também temos grande preocupação com a América Latina.
A TV Brasil é aberta, generalista e tem apenas 4 canais próprios. Ela tem inovado no sentido de dar destino às vinte e quatro TVs Educativas que estão perdidas, abandonadas, sem projetos. Um patrimônio do povo brasileiro com o qual estamos constituindo a rede pública de televisão. 

Reconhecimento

Para equipar todo o sistema, nos últimos meses foram destinados R$ 110 milhões em licitações. Vencer o preconceito, obter o reconhecimento do jornalismo de qualidade, renovar a grade de programação, e expandir e consolidar a redes própria e a associada, são as prioridades:
— Vamos instalar os canais digitais O próximo será o do Rio de Janeiro. O futuro da TV pública não está no sistema analógico, que vai terminar em 2016. Apesar da crise econômica, continuaremos investindo e cumpriremos uma série de agendas relativas à democratização, como o Fórum das TVs Públicas, a ser realizado no fim deste mês, e a Conferência Nacional de Comunicação, onde estaremos lutando, junto com a ABI e outras entidades do campo democrático, por um marco regulatório da radiodifusão brasileira que responda aos novos desafios tecnológicos. No final deste ano, sob o patrocínio da EBC, realizaremos o Seminário de Mídias Públicas da América Latina, buscando o fortalecimento deste setor e do campo público. Na Argentina, o debate do momento é a nova lei de radiodifusão. O Paraguai está pedindo a nossa ajuda para a implantação da TV Pública paraguaia. O Uruguai também.

Ainda sobre a programação da TV Brasil, Tereza destacou as ações de apoio à produção independente:
— Queremos fortalecer as formas mais republicanas de construir esta televisão. Na semana passada, por exemplo, lançamos um regulamento para a contratação de programas feitos por produtores independentes. Precisamos construir esta programação com a participação dos atores excluídos, que estão fora das grandes estruturas. Em relação aos conteúdos regionais, estamos construindo formas de associação para co-produções com as TVs estaduais, comunitárias e universitárias. Vamos lançar o Pitching TV Brasil, com base na Lei 8666, para dar oportunidade a todos. Lançaremos também uma forma republicana de licenciar conteúdos já existentes. E estamos envolvidos no projeto denominado Operador Nacional da Rede Pública Digital.

Tereza ressaltou que a EBC opera também com oito emissoras de rádio, que prestam importantes serviços, especialmente em áreas distantes e isoladas do País, com a Agência Brasil, e a EBC Serviços, braço paralelo que opera sob contrato com o Governo Federal para realizar o canal NBR, o programa “Café com o Presidente”, viagens do Presidente da República e outros atos oficiais.

Compromisso

Em resposta à pergunta do Conselheiro Mário Augusto Jakobiskind sobre o apoio da TV Brasil a jornalistas que estão fora da chamada grande mídia, Tereza Cruvinel lembrou o compromisso da emissora com o jornalismo isento, não-governista, que exige, segundo ela, sacrifício da opinião em detrimento da informação.
— Jornalistas das mais diversas opiniões deverão participar dos nossos debates, como no programa Três a Um, ancorado pelo jornalista Luiz Carlos Azêdo, sobrinho de Maurício Azêdo. Estamos empenhados em consolidar o espaço da credibilidade e da informação.

Questionada pela cineasta Tetê Moraes, Presidente da Associação Brasileira de Cineastas do Rio de Janeiro, sobre o incentivo ao setor audiovisual e às produções independentes, Tereza reforçou as ações vinculadas à política de parceria com este setor, em especial os editais de pitching.

Os participantes do evento sugeriram debates na TV Brasil em torno de temas como a Conferência Nacional da Comunicação, a exigência do diploma para o exercício do Jornalismo, e a implantação de programas sobre sustentabilidade, educação ambiental, música, esporte, entre outros.

Ao final do encontro, Maurício Azêdo agradeceu a presença de Tereza Crivinel e da platéia, e o empenho do Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Liberdade de Expressão da ABI,Wilson Fadul Filho; do Conselheiro e membro desta Comissão, Mario Augusto Jakobiskind e do Primeiro-Secretário do Conselho Deliberativo da Associação, Lênin Novaes, na organização do debate:
— Desejamos que Tereza prossiga nesta senda que abriu, marcada por êxitos conquistados com extrema dificuldade, inclusive arrostando incompreensões inadmissíveis, inoportunas por se tratar de empresa de criação recente. Agradecemos por esta demonstração de seu espírito democrático dialogando em torno de uma questão tão relevante com a Comunicação e a TV pública no Pais.

O compositor Edeor de Paula, acompanhado pelos presentes, entoou o samba  “Os Sertões”, de sua autoria, enredo da escola de samba Em Cima da Hora no carnaval de 1976.