A SAGA DA Petrobrás, DA REVOLUÇÃO DE 30 AOS DIAS DO PRÉ-SAL – Capítulo 12


19/11/2019


Cap. 12 / Agosto, 1954

A PETROBRÁS SAI DO PAPEL

 

Nenhum dos grandes jornais deu a notícia. Mas a Petrobrás, a empresa criada no ano anterior pela lei que instituíra o monopólio estatal do petróleo, acaba de assumir, no domingo, 1º de agosto de 1954, o controle efetivo de todas as reservas de petróleo em território brasileiro, de todos os campos em pesquisa e exploração, de todos os navios transportadores, de todas as unidades de processamento e armazenamento de óleo bruto e derivados e de todas as outras instalações industriais ligadas à atividade petrolífera e de propriedade do governo federal. É o caso, por exemplo, da Refinaria de Mataripe, construída na Bahia para processar preferencialmente o petróleo de Lobato.

Agora a Petrobrás sai do papel e passa a exercer, de fato, o monopólio estatal do petróleo, para o qual fora criada pela Lei 2004, assinada a 3 de outubro de 1953. A Lei 2004 estabelecia o monopólio estatal do petróleo e criava a Petrobrás, empresa de economia mista, sob controle do governo federal, encarregada da execução desse monopólio e de pesquisar e explorar as reservas petrolíferas do país.

A principal missão da Petrobrás não seria a produção de lucros, mas garantir o abastecimento de derivados de petróleo em todo o país, nas melhores condições para a economia brasileira. Essa era uma exigência que nenhuma lei poderia impor a nenhuma empresa privada. Mas uma empresa pública poderia perfeitamente colocar o interesse pelo lucro abaixo dessa responsabilidade.

No momento em que a Petrobrás era criada, o Brasil produzia apenas 2.100 e refinava apenas 5 mil barris por dia de petróleo. O Brasil dependia quase totalmente de petróleo e de derivados (gasolina, diesel, óleo combustível) importados. Em caso de guerra ou de uma simples crise internacional, o Brasil não teria petróleo para mover sua economia. Nem para realizar operações de patrulhamento e vigilância necessárias à proteção de suas fronteiras e de seu litoral. O Brasil não teria como defender seu território e garantir sua independência e soberania.

Cinquenta anos depois da criação da Petrobrás, o Brasil produzia, por dia, mais de 1 milhão e 600 milhões de barris de petróleo (para um consumo de cerca de 1 milhão e 800 mil barris) e refinava 1 milhão e 800 mil barris, isto é, a totalidade de seu consumo. Pouco depois, o Brasil alcançaria a autossuficiência em matéria de petróleo e, adiante, com a descoberta das imensas reservas do Pré-Sal, poderia assumir o papel de país exportador de petróleo.

Nenhum dos grandes jornais registrou o fato de que nesse domingo, 1º de agosto de 1954, a Petrobrás deixava de ser uma empresa de papel, uma abstração jurídica, para tornar-se uma realidade muito mais difícil de destruir do que até esse momento. Até outubro de 1953, a Petrobrás era um projeto, que os interesses opostos fizeram de tudo para derrubar ou desfigurar no Congresso. De outubro de 1953 a maio de 1954, ela se tornara uma criação legal, que só poderia ser desfeita por outra lei que a extinguisse ou despojasse de alguma prerrogativa essencial. Em maio de 1954, a Petrobrás fora instalada como empresa, com registro em cartório, investidura de diretores e contratação dos primeiros funcionários.

A 1º de agosto, porém, ela dava o passo mais importante no processo que a transformaria na maior empresa brasileira e numa das maiores indústrias petrolíferas do mundo, ao assumir o controle jurídico e físico dos campos petrolíferos já encontrados e ainda por encontrar e de todas instalações de propriedade governamental de uma nascente e promissora indústria petrolífera, inclusive uma refinaria e alguns navios.

Mas os grandes jornais publicavam, nesses dias, anúncios enormes, de página inteira, às vezes duas páginas inteiras, promovendo a nova gasolina azul da Esso, a subsidiária do grupo Standard Oil (Rockefeller) no Brasil. Normalmente as gasolinas, os lubrificantes e os derivados de petróleo em geral eram anunciados mais nas rádios que nos jornais e, já então, nas TVs. Esses espalhafatosos anúncios nos jornais não se destinavam a vender gasolina – não se destinavam a vender o que quer que fosse. Eles tinham sido programados e pagos para consolidar e angariar simpatias. Simpatias contra a Petrobrás. Eles, no entanto, não foram postos no jornal do governo, A Noite, um dos vespertinos mais populares do Rio de Janeiro.