13º Fórum Liberdade de Imprensa e Democracia com IMPRENSA, ESPM e ABI


07/05/2021


Por Deborah Freire, POrtal Imprensa

Censuras modernas e liberdade de imprensa: qual o papel do jornalismo na defesa da democracia. 

Quais os tipos de censura presentes na sociedade brasileira atual? Como elas afetam a imprensa e qual o papel do jornalismo diante dessas barreiras? O 13º Fórum Liberdade de Imprensa e Democracia, promovido pela Revista IMPRENSA, ESPM e Associação Brasileira de Imprensa (ABI), debateu o tema durante evento promovido na segunda-feira (3), Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.

No encontro realizado online, o jornalista e fundador da Revista IMPRENSA, Sinval Itacarambi abriu as discussões com um alerta. Ele lembrou que a liberdade de expressão é cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988, portanto a censura é um risco à democracia brasileira, o que torna o jornalista ainda mais responsável por denunciá-la.

Mas como a censura opera diante das liberdades constitucionais e como ameaça a democracia? O palestrante do Fórum, Leandro Machado, cientista político, respondeu ao questionamento.

A democracia é uma “floresta”

Ele iniciou com a análise do tema do debate, “As censura são várias. A democracia é única”, do qual discordou ao falar que para ele a democracia não é única, não é uma instituição pronta e acabada e não existe um modelo a ser seguido.

“Quando nos perguntamos o que é democracia, alguns lembram do Congresso, da Praça dos Três Poderes, mas eu não vejo a democracia assim. Para mim, ela está mais próxima de uma floresta, que nunca está acabada e não tem modelo perfeito. A gente tem indicadores de que ela está saudável, mas é um sistema complexo, com vários organismos. Uma cadeia tão complexa que, perder uma parte do sistema pode significar perder o todo”, opinou.

E qual o papel das liberdades de opinião, de expressão e de imprensa dentro desse sistema complexo? Para Machado, elas alimentam o sistema, como rios que irrigam e mantêm vivas as florestas.

Nesse contexto, o cientista se coloca favorável à diversidade de opiniões e cobra dos indivíduos a defesa da democracia, ao contrário do que muito se coloca hoje, que é a necessidade de um defensor maior do sistema, como único responsável por ele.

Machado fez quatro conclusões sobre o que acredita dever existir em uma democracia e apresentou no debate:

1 – Uma democracia, quanto mais diversa, mais vozes dissonantes, mais potente ela é, menos sujeita a degradação;

2 – Não há e nunca haverá um salvador da pátria ou da democracia. Não há um pilar. O que há são pessoas que a aprimoram diariamente e constantemente; um conjunto de pessoas unidas e com o propósito de mantê-la viva;

3 – Todos nós precisamos nos envolver a cada momento, em eterna vigilância, inclusive dos nossos atos individuais. Por meio dos nossos textos, da nossa participação em sociedade, do compromisso com a escola, entre outras ações;

4 – Não precisa saber gerenciar o sistema todo, ter uma visão dele no mínimo detalhe. “O que você precisa é começar plantando uma árvore, ou seja, pequenas ações. A nossa democracia, no Brasil, tem sido avidamente devastada”.

E quando a censura é feita em nome da democracia? Esse foi o questionamento do advogado André Marsiglia Santos, moderador do debate.

Leandro Machado reforçou que é preciso aprender a conviver com ideias contrárias às nossas a fim de amadurecer o debate. “A ideia de que precisamos salvar a democracia é pueril, fala muito sobre o nível do debate público no país. A história do Brasil é pautada pela censura. É uma sociedade que tem medo de discordar. Por sermos um país infantilizado quanto ao debate público, caminhamos para os ataques às pessoas por conta de suas ideias. Precisamos amadurecer e aprender a conviver com ideias diametralmente opostas às nossas”, concluiu.

Censura na Ditadura Militar

Paulo Jerônimo, presidente da ABI, também participou das discussões. Ele que atuou no jornalismo no período da Ditadura Militar, lembrou que esteve presente na reunião que instituiu o AI2 e estabeleceu a censura oficial nas redações.

Foi nesse episódio, ele conta, que Roberto Marinho, fundador da Globo, disse a famosa frase “Dos meus comunistas cuido eu”, que na verdade teria sido “Do meu jornal cuido eu”, após ordem para demissão dos comunistas das redações de jornais.

Na época, os censores atuavam dentro dos veículos de imprensa, enquanto hoje a censura ocorre por meio de ações judiciais voltadas principalmente contra pequenos jornais e blogueiros, o que levou a uma reação das entidades de jornalismo.

É a “ditadura dos juízes de primeira instância”, ele cita, que tem gerado uma avalanche de processos contra Luís Nassif, Rubens Valente, Felipe Neto, entre outros.

Por isso, a ABI entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para que a responsabilidade de jornais e jornalistas só ocorra na esfera civil quando ficar provado que houve dolo e culpa na divulgação.

“A Fenaj, a Abert, a Repórteres Sem Fronteiras, o Instituto Vladimir Herzog, a Abraji e até o Departamento de Estado dos EUA criticam a liberdade de imprensa do Brasil, isso após a posse desse presidente. Das 68 agressões a jornalistas registradas ano passado, 59 foram proferidas pelo presidente [Jair Bolsonaro]”, apontou Paulo Jerônimo.

Tempos modernos, censuras sofisticadas

Quem também esteve presente no Fórum foi o professor da ESPM, Ricardo Gandour, que explicitou alguns mecanismos sofisticados de censura presentes na atualidade, que muitas vezes não são vistos como tal.

“Em oposição ao tempo em que censurar implicava em ter menos informação, hoje temos formas sofisticadas de censura muitas vezes com mais informação”, explica.

Um exemplo levado por ele é o patrocínio da divulgação de informações falsas, que pode se dar até mesmo em uma entrevista coletiva de imprensa, a partir de uma fala oficial.

“A fala diz ‘olha, lockdown é bobagem, o que é bom é esse remédio’. Ela tenta diminuir o acesso à informação por meio de um excesso de informação faceada, tenta solapar a veiculação do que a incomoda. A informação falsa é uma forma de censura, pois deturpa o ambiente”, alerta.

Outro mecanismo sofisticado de censura apontado pelo professor é dificultar o acesso à informação, como o Ministério da Saúde fez ao decidir não divulgar de forma transparente os dados da covid-19, no ano passado.

A tentativa de influenciar algoritmos nas redes sociais para que informações verdadeiras percam relevância enquanto as falsas ganham é outra forma de censura moderna, segundo Gandour.

Ele explica que a comunicação direta dos governantes por meio das redes sociais criou o que ele chama de populismo digital, porque eles geram atenção desproporcional aos próprios discursos por meio de robôs, perfis forjados ou patrocinados, um “falso clamor digital”.

No jornalismo, o mesmo pode ocorrer quando se abre espaço para negacionistas e pessoas sem base científica na mídia, gerando os efeitos negativos do excesso de informação. “O acesso é saudável, mas temos que lidar com a governança nos mecanismos de compensação. A única forma de tentar continuar combatendo a censura é fincar o pé na defesa do jornalismo”, afirma.

O debate completo pode ser visto por meio deste link.

Outras discussões também marcaram o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. A Abraji em parceria com a Unesco e outras sete organizações promoveram um seminário internacional sobre o tema.

Também a Abraji, junto à Repórteres sem Fronteiras, com apoio do Twitter Brasil, promoveu um evento com jornalistas locais das cinco regiões do país. A ação fez parte da campanha internacional #SigaJornalistasLocais.

E a ABI debateu os desafios da Liberdade de Imprensa no Brasil com o presidente Paulo Jerônimo, as conselheiras da ABI Cristina Serra e Regina Zappa, e o vice-presidente e coordenador da Comissão de Liberdade de Expressão da ABI, Cid Benjamin.